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O Feminino e os Livros: CABINE PARA MULHERES

O livro da escritora indiana Anita Nair, CABINE PARA MULHERES, foi editado pela Editora Nova Fronteira, em 2003. 

Eu tenho uma história curiosa com esse livro. Lembro que há uns bons pares de anos, numa das minhas das costumeiras “garimpagens” em livrarias, me deparei com esse livro e lendo sua contracapa me interessei em lê-lo. Não me lembro o porque não o comprei, mas o livro ficou marcado na minha cabeça. Vira e mexe me lembrava dele, me arrependia de não o ter comprado, me dava vontade de ter comprado e lido, mas não lembrava do nome do livro, do nome da autora, nem da editora. Só me lembrava que o romance se passava na Índia, versava sobre 6 mulheres desconhecidas uma das outras, que viajavam por uma noite numa cabine de trem destinada só para mulheres e que durante esse período contavam umas as outras suas histórias. E tinha a vaga noção que a capa era “meio verde, meio azul”!!! Meio difícil achar algo assim… 
Bom, passei uns bons anos tentando ver se descobria algo sobre o livro, até que por acaso, numa busca pela internet por outro livro, me deparei com ele. Comprei na hora e li; isso em 2008. Adorei! Reli agora para fazer esse post e gostei mais ainda! 

Realmente o livro se passa nessa viagem onde Akhila, a personagem principal, toma um trem numa cabine só para mulheres, que existia em quase todos os trens noturnos na Índia até 1998. Como diz a autora sobre sua personagem: 
Akhila é esse tipo de mulher. Faz o que esperam que faça; sonha com o resto….Essa é Akhila, então. Quarenta e cinco anos. Sem óculos de lente cor-de-rosa. Sem marido, filhos, lar ou família. Sonhando com evasão e espaço. Ávida de vida e experiência. Louca para conhecer gente. 

Akhila sempre viveu com sua família e foi seu arrimo desde a morte do seu pai, quando era bem jovem. Ela se sacrifica totalmente a essa família e não é reconhecida, na verdade é meio menosprezada como a irmã solteirona. 
O livro começa quando ela toma a decisão de viajar para longe, viver sozinha pela primeira vez, tomar a vida nas próprias mãos. Ela toma então esse trem noturno, onde passa a noite numa cabine só para mulheres, onde mais 5 mulheres também estão viajando. Elas começam a conversar e Akhila faz a elas as seguinte pergunta: “É possível uma mulher viver só”? 

Cada mulher então vai contar a sua história, tentando de certa forma ajudar Akhila a responder para si sua questão e decidir que rumo tomar na sua vida. São 5 capítulos , cada um com uma história e com um título e entre eles, em capítulos sem nome, vamos conhecendo a história de vida de Akhila.  

A primeira a contar sua história é Janaki, a mais velha delas, casada há 40 anos. Ela se descreve : “Sou uma mulher que sempre foi protegida. Primeiro, por meu pai e meus irmãos; depois, por meu marido. Mulheres como eu acabam se tornando frágeis”. O capítulo se chama “Uma certa idade” e trata da vivência de muitos anos de um bom casamento, mas também das enormes limitações que uma mulher, que vive em função do marido,  vive. 

O segundo, chamado “Pode ir, vovó, pode ir”, fala de Sheela, uma garota de 15 anos, de enorme sensibilidade para entender a alma dos que a cercam. É uma história acerca da delicadeza! 

O terceiro é “Óleo de vitríolo” e, ao contrário do anterior, é de uma crueza dolorosa. Conta a história de Margaret Shanti, uma mulher cujo marido, de uma crueldade velada e sutil, a destrói por dentro, detonando todo seu brilho e auto-estima. E de como ela, para se vingar e retomar o poder sobre si e exercer o poder sobre ele, consegue, com seus dotes culinários e muita manipulação, fazer seu marido, um homem vaidoso e magro, virar um homem gordo e a mercê dela. 

A quarta história, “Flutuando” é de Prabha Devi, uma mulher que foi sempre cheia de vida, curiosa por diversidades de experiências, sensual e cheia de amor próprio, e que vai se tornando uma pessoa apagada, reprimida, deprimida, pela cultura machista internalizada. E de como vai retomar aquela que ela foi ao resolver aprender sozinha a nadar. É muito poético esse capítulo. 

A quinta história é a mais triste, “Parece, mas não é”, de Marikolanthu. Ela é a única que vem de uma classe econômica/casta mais baixa e sua história, de muito sofrimento e peripécias, não fica longe da vida, muito vezes, trágica das mulheres pobres nas culturas machistas. 

O último capítulo, “A voz de Akhila” vai contar o que a personagem faz após descer do trem. É lindamente descrita a libertação dela e o tomar seu destino em suas mãos! 

Livro imperdível!!! 
É muito rico porque cada capítulo fala do feminino e das mulheres sob um ângulo, abarcando a generosidade e a crueldade, a delicadeza e a aridez, a luz e a sombra. Além de tudo, apesar de ser passado na Índia e de ter traços específicos daquela cultura (que também tornam o livro mais interessante) é completamente universal: tenho certeza que qualquer mulher vai se identificar com suas personagens. 
Valeu a pena “caçá-lo” por tanto tempo. Com isso aprendi uma lição: quando um livro piscar para mim querendo ser lido, não discuto mais, compro e leio.

Texto de Cristina Balieiro

3 comentários

  1. Malu Machado disse:

    Olá Cristina. Que delícia de descrição. fiquei louca para comprar o livro. Olha, fica o convite para vocês visitarem o meu blog, Absinto. Por lá também falo do feminino, de várias maneiras. Acabei de criar uma fan page do blog no facebook. Gostaria muito de trocar ideias com vocês por lá também. Se quiserem, me adicionem.

    Abraços e continuem iluminando o caminho. Estou adorando aprender coisas novas por aqui.

  2. Oi Malu, que bom que te "contaminei" para ler esse livro: acho que vc vai gostar; depois me conta. E já vi seu blog, muito legal. E que inveja do seu encontro com a Adélia Prado: eu ADORO ela, sua poesia e sua postura no mundo. Sempre que ela vem aqui em Sampa tento ir ouvi-la.

    Já enviei solicitacao de amizade pelo face, vamos sim trocar mais figurinhas!
    Bj
    Cris

  3. Ana Nazaré disse:

    O "Vagão Rosa" indiano…rsss…

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