O Feminino e o Sagrado um jeito de olhar o mundo

O resgate de antigos amores

Como parte de uma pesquisa que estamos fazendo, temos ouvido várias histórias de amor. Entre elas há tantos casos de pessoa que retoma antigos relacionamentos, que fiquei me perguntando por que isso está acontecendo.

Penso que tem a ver com todas as buscas que fazemos do que ficou perdido lá atrás.
Claro que certas coisas terminam mesmo, e ainda bem.
Mas algo que não foi vivido até o fim pode não sumir facilmente, e continuar nos assombrando nos porões mentais, esperando para ser desenterrado como um tesouro de pirata que nos aguarda na ilha em que o escondemos quando jovens.

Isso me faz pensar que as aventuras inacabadas pedem expressão completa.
Talvez não somente pela pessoa em si – por exemplo, o homem que namoramos e perdemos – mas por nós mesmas.
Sim, nós mesmas. Como será assumir plenamente uma relação com Fulano? Como será ter de fato um caso com aquele príncipe, ou princesa, antes inacessível?

Na mesma linha, outra mulher que também retomou uma relação de juventude me disse: -“ Eu não podia continuar casada porque tinha de viver um amor completo, entende?
Para mim, a expressão “tinha de viver” é a chave. Nesse caso trata-se de amor, mas podemos “ter de viver” uma profissão abandonada, talentos deixados de lado, aventuras antes impossíveis…
Por exemplo, eu voltei a escrever, a Cristina, a desenhar; outra amiga, a fazer escultura e outra a estudar na faculdade.

Hoje, muitos de nós podemos viver até idade mais avançada, com boa saúde e aparência, certa autonomia financeira e liberdade de ação. Não sendo preciso encerrar a vida ativa aos 40, há oportunidade para esses resgates. E podemos re-encarnar, assim, em novos papéis, com possibilidades de fazer coisas que, em outras épocas, ficariam apenas nos sonhos e vagas memórias.

Na Jornada do Herói, depois de conseguir o que foi buscar, o herói tem de retornar a sua aldeia trazendo o tesouro conquistado.
Se a gente pensar na maturidade como um tipo de tesouro, talvez estejamos fazendo nosso Caminho de Volta através desses processos, no fundo, de auto descoberta e de oferta ao mundo dos frutos que assim colhemos.

Como diz Joseph Campbell sobre o Caminho de Volta: … “A idéia geral é que é preciso demonstrar aquilo que você foi recuperar, o potencial irrealizado, não utilizado, em você. O sentido dessa Jornada é a reintrodução desse potencial no mundo…Deve-se devolver esse tesouro do saber e integrá-lo à vida racional” *

* pg 143, MITO E TRANSFORMAÇÃO, Ed Ágora
Texto e fotos de Beatriz Del Picchia

3 comentários

  1. Cassia disse:

    Querida minha, é isto mesmo! Temos de retomar a nós mesmas perdidas num beco do passado, nossas possibilidades desperdiçadas…Amei teu texto! Beijo.

  2. Obrigada Cassia, e que possamos viver e re-viver nossas possibilidades no máximo! bjs

  3. Anônimo disse:

    Belo texto. Sobre retorno a antigos amores acho que acontecem realmente porque não permitimos a morte e muito menos os lutos. E o luto é um processo tão importante no fim de relacionamentos, trabalhos, amizades… A morte de um símbolo deixa um buraco, mas que só poderá ser preenchido se o luto acontecer de fato. Acho que coletivamente também é assim. Carregamos resquícios da República Velha, por exemplo… Namastê Anasha http://www.umbigodeeros.blogspot.com

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