O Feminino e o Sagrado um jeito de olhar o mundo

Um telefonema sobre irmãs e Mestres

Alguns dias atrás, recebi um telefonema de uma pessoa, que vou chamar de R, para preservar sua privacidade.
Ela tem quase 70 anos. Tem uma vida intensa, cheia de altos e baixos, em muitos sentidos; passou por doenças fatais de pessoas queridas, e ela mesma tem a saúde comprometida.É uma mulher forte, com opiniões independentes, que ás vezes ainda choca o ambiente conservador que a cerca.
No telefonema, ela me disse mais ou menos isso:
Bia, li o livro O feminino e o sagrado: mulheres na jornada do herói bem devargarinho. Uma porque não sou muito de ler, e outra porque queria assimilar bem o conteúdo. Terminei agora, e estou ligando para dizer que me reconheci nele. Sabe, eu vivi aquelas etapas todas, só que não sabia dizer o nome delas!
Fiquei feliz, porque eu mesma sinto coisa parecida lendo livros de outras pessoas.Quando isso acontece comigo, a sensação que tenho é que existe uma “turma” de gente semelhante que se encontra por meio de um livro, ou de um blog como esse… Somos irmãs, somos da mesma tribo, e a palavra cumpre sua função de nos unir, tipo: “ela sabe do que estou falando, ela também sente o que estou sentindo.
Além disso, esse telefonema me fez pensar como dar nome às coisas faz diferença.É como se, com isso, a gente re-conheça a própria experiência, que assim ganha mais conteúdo
E também pode legitimar certas experiências internas, que na nossa cultura tão extrovertida e “fazedora” não têm valor algum.
Mas R. continuou o telefonema:
E vi que até tive Mestres na minha jornada, como vocês falam.Mas os meus não foram gurus nem nada exótico, mas sim pessoas extremamente simples, camponeses que trabalhavam na minha fazenda.Conheci gente que nem sabia ler, mas com tanta sabedoria! Eles me apoiaram e me compreenderam mais do que pessoas instruídas e doutores.
Não admira que R. veja como Mestres essa gente ligada à terra.Acho que quem vive diretamente dependente da natureza, tão perto da Grande Mãe, pode conectar com sua sabedoria com mais facilidade…E é uma sabedoria do coração, vinda da experiência própria e integral, diferente do conhecimento erudito. É vital, visceral, profunda.
E assim uma camponesa, um boiadeiro ou uma roceira podem ser apoios, guias e Mestres de suas patroas e patrões.
Na Jornada não existe hierarquia de classe social.
E R. tem a sabedoria de perceber isso.
 
Texto e criação gráfica de Beatriz Del Picchia, desenhos Cristina Balieiro

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