O Feminino e o Sagrado um jeito de olhar o mundo

A deusa navajo e o caminho das bençãos


O povo navajo, originalmente nômade, se estabeleceu há séculos e vive ainda hoje em um planalto que se estende por parte dos estados do Arizona, Utah e Novo México, nos Estados Unidos.
A Mulher que Muda ou Istsá Natlehi é a mais reverenciada figura sagrada desse povo; é única deidade do seu panteão que só apresenta o lado bom, luminoso. É chamada de a Senhora da Benevolência, pois é quem traz a abundância e as lições necessárias para a vida em harmonia na Terra.
É também conhecida como a “A que se Renova”, “A Mulher Mutante” e “A Mulher Turquesa”. É identificada com o processo da vida e da natureza, sendo vista como jovem na primavera, como mulher madura no verão e outono e como velha no inverno, para voltar a ser jovem novamente na outra primavera: é a que nunca morre, a que sempre renasce, a eternamente mutável, a cíclica.

Ela doou a seu povo o Caminho das Bençãos, o mais popular cerimonial navajo de cura. Os navajos têm um foco muito grande na cura simbólica/psicológica e social/comunitária e sua religião busca com seus inúmeros e complexos rituais, chamados de “Caminhos”, a harmonia do homem com a natureza. Eles acreditam que qualquer doença, acidente ou má sorte são frutos desse desequilíbrio.
Os “Caminhos” são realizados por xamãs e curadores e compostos normalmente da contação de um mito que carrega simbolicamente o significado do ritual, de cânticos, preces, banhos cerimoniais, feitura de pinturas simbólicas na areia e ingestão de poções e chás feitos com ervas.

O Caminho das Bençãos, tendo como base o mito da Mulher que Muda, é utilizado em numerosas situações: para pedidos de boa sorte e saúde, proteção do rebanho, proteção das sementes, felicidade no casamento, proteção da casa, proteção para a gestação e os partos, proteção das crianças e proteção contra acidentes. Além dessas bençãos, esse rito medicinal fornece imunidade contra várias entidades malignas.

Conta o mito que a Mulher que Muda apareceu no mundo de forma sobrenatural. Os antigos diziam que ela era filha do Rapaz da Vida Longa e da Moça da Felicidade, deidades que moravam no interior da Terra. A deusa ancestral Atse Etsa, guiada por uma nuvem escura de chuva, a descobriu debaixo da montanha ainda bebê e decidiu educá-la para ser a salvadora da Terra. Alimentada de pólen, a deusa atingiu a fase adulta, tendo sua kinaalda, a menarca, com apenas dezoito dias. Por isso, a Mulher que Muda é quem preside o ritual da puberdade das meninas navajo quando da sua primeira menstruação.
Tendo se tornada adulta tão prematuramente logo tornou-se amante do Sol, o deus mais poderoso para os navajos. Faziam amor todos os dias ao anoitecer e tiveram dois filhos gêmeos e guerreiros: Nayenezgáni, o Matador de Monstros e Tobadsistsíni, o Filho da Água. Depois que a Mulher que Muda os pariu, precoces como a mãe, tornaram-se adultos em apenas oito dias. Então com sua ajuda partiram em busca do Pai Sol para pedirem seus poderes e com eles conseguirem guerrear e matar os monstros que assombravam a Terra.
Depois de uma longa jornada, os irmãos finalmente encontraram seu pai Sol. O Sol relutou bastante, mas finalmente permitiu que os filhos levassem seus poderes para usarem em sua luta. De posse deles, os gêmeos voltaram à Terra. Aqui chegando, depois de terríveis batalhas, finalmente venceram os monstros.
Entretanto a guerra que os irmãos travaram foi muito sangrenta e diminuiu demais a quantidade de habitantes da Terra. Foi então que a Mulher que Muda raspou a pele de seus seios e com ela criou o casal ancestral do povo navajo. Eles se reproduziram rapidamente e deram origem aos grandes clãs navajos.
Somente quatro monstros sobreviveram a guerra dos gêmeos contra o mal: o Inverno, a Miséria, a Idade e a Fome. A deusa permitiu a sobrevivência deles para que seu povo pudesse ter mais apreço às suas dádivas.
Depois de dançarem com a mãe, comemorando a vitória, seus filhos construíram para ela, no Céu uma linda casa toda cravejada de turquesas. Sentindo que sua missão estava completa, a Mulher que Muda retirou-se para seu castelo celeste e de lá abençoou seu povo, presenteando-os com as estações do ano, as plantas, os animais e com o Caminho das Bençãos. Lá em sua nova morada o Sol pode visitá-la todas as noites após cumprir seu trajeto diurno.
A Mulher que Muda, seu marido, o Sol e seus dois filhos, o Matador de Monstros e o Filho da Água formam a “Sagrada Família” navajo.

Trechos do livro O LEGADO DAS DEUSAS 2

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