O Feminino e o Sagrado um jeito de olhar o mundo

Virgínia Woolf e um assassinato necessário


Já publiquei esse post, mas acho tão importante que hoje, dia 9 de março, um dia depois da comemoração do dia da Mulher, trago ele de novo. Acho que matar o “Anjo do lar” é uma tarefa essencial, não só para as escritoras. Esse assassinato é um ato necessário e legítimo para cada mulher que quer ser protagonista da sua história  e ter as rédeas da sua vida.

Existem vários tipos de fantasmas especialmente criados para as mulheres por essa cultura patriarcal e machista que nos assombra. e alguns podem ser muito perigosos! Virginia Woolf sabia muito bem disso, afinal se viu obrigada a matar um deles. Mas como ela disse foi legitima defesa, um caso de vida ou morte. Em 1931 Virginia partilhou a descrição dessa batalha numa conferência para a Sociedade Nacional de Auxílio às Mulheres quando leu um pequeno ensaio escrito para ocasião: Profissão para mulheres.

E, quando eu estava escrevendo aquela resenha, descobri que, se fosse resenhar livros, ia ter de combater um certo fantasma. E o fantasma era uma mulher, e quando a conheci melhor, dei a ela o nome da heroína de um famoso poema, “O Anjo do Lar”. Era ela que costumava aparecer entre mim e o papel enquanto eu fazia as resenhas. Era ela que me incomodava, tomava meu tempo e me atormentava tanto que no fim matei essa mulher.

(…) Ela era extremamente simpática. Imensamente encantadora. Totalmente altruísta. Excelente nas difíceis artes do convívio familiar. Sacrificava-se todos os dias. Se o almoço era frango, ela ficava com o pé; se havia ar encanado, era ali que ia se sentar – em suma, seu feitio era nunca ter opinião ou vontade própria, e preferia sempre concordar com as opiniões e vontades dos outros. E acima de tudo – nem preciso dizer – ela era pura. Sua pureza era tida como sua maior beleza – enrubescer era seu grande encanto.

(…) E, quando fui escrever, topei com ela já nas primeiras palavras. Suas asas fizeram sombra na página; ouvi o farfalhar de suas saias no quarto. Quer dizer, na hora em que peguei a caneta para resenhar aquele romance de um homem famoso, ela logo apareceu atrás de mim e sussurrou: “Querida, você é uma moça. Está escrevendo sobre um livro que foi escrito por um homem. Seja afável; seja meiga; lisonjeie; engane; use todas as artes e manhas de nosso sexo. Nunca deixe ninguém perceber que você tem opinião própria.

(…) Fui para cima dela e agarrei-a pela garganta. Fiz de tudo para esganá-la. Minha desculpa, se tivesse de comparecer a um tribunal, seria legítima defesa. Se eu não a matasse, ela é que me mataria. Arrancaria o coração da minha escrita.

 

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